Barraco eleitoral, uma manifestação cultural

Pleno mês de eleições no Canadá. Mas afinal, onde está o barraco?

Ilustração de Marc Hatot.

Cristiano de Oliveira é colunista do Jornal de Toronto

Pleno mês de eleições no Canadá, e o brasileiro deve estar sofrendo com o choque cultural. Mas afinal, onde está o barraco? Não tem tabefe, não tem gritaria, não tem molecagem. Família nenhuma rachando, não tem dedo na cara, nem candidato com nome de Paul das Girls, Grete Cover, Ninguém ou Alceu Dispor. Pois a cultura de um país é formada por todos que nele residem, e você, caro brasileiro perdidão, também tem muito a contribuir.

O barraco eleitoral é importante elemento de cada cultura. Cada país, cada região, transforma sua eleição em palhaçada ao seu modo, respeitando a diversidade cultural da sociedade e os povos que a compõem. Assim sendo, é importante respeitar e colaborar com o barraco eleitoral canadense, trazendo para esse grande conjunto de práticas sociais e simbologia a nossa própria e bonita experiência em gerar eleições embaraçosas.

Canadense adora o passado. Uma coisa que o camarada disse ou fez um dia vai com certeza virar escândalo 600 anos depois. Trudeau despencou nas pesquisas depois que uma revista americana (estranhamente interessada na eleição canadense, coisa que nunca acontece) publicou sua foto com a cara pintada à “blackface”, tirada durante uma festa em 2001. Ele pediu desculpas, seu governo não foi marcado por quaisquer atos ou medidas discriminatórias… mas a memória do povo não perdoa. Ora, pois o brasileiro pode contribuir imensamente para essa faceta do barraco eleitoral local, ensinando o povo a não se lembrar de absolutamente nada que aconteceu do almoço de ontem pra trás. O candidato pode ter confessado à nação até que rói unha e cospe no sofá – amanhã o assunto já é outro.

Canadense gosta de defender direitos adquiridos. Andrew Scheer deu diversas declarações no passado se opondo aos direitos das mulheres e da comunidade LGBTQ, além do seu partido defender cortes agressivos no sistema de saúde (vide Doug Ford em Ontário), para revolta da população local. Pois o brasileiro está apto a prestar valorosa contribuição a essa cultura trazendo seu imenso carinho e afeição pelas ações do tipo “pó cortá é tudo”. Nossa habilidade de ouvir discursos que prometem acabar com a nossa raça, mas bater palma pra eles pelo simples pronunciar das palavras “cortar”, “reduzir”, “economizar”, “Cuba” e “Venezuela”, adicionará algo muito bonito à colcha de retalhos da cultura canadense e sua prática do barraco eleitoral.

O imigrante tem muito a aprender, mas também tem muito a ensinar. Com o passar dos anos, não se espante quando seu coração sentir aquele calorzinho gostoso da lembrança de casa ao passar pela rua e ver uma plaquinha dizendo “Vote for Watermelon Woman” ou “Ontario for Tiriráica, worse than is don’t stay”.

Adeus, cinco letras que choram.

Sobre Cristiano de Oliveira (30 artigos)
Cristiano é mineiro, atleticano de passar mal, formado em Ciência da Computação no Brasil e pós-graduado em Marketing Management no Canadá. Foi colunista do jornal Brasil News por 12 anos. É um grande cronista do samba e das letras.

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