D. Pedro e o barraco nosso de cada dia

Esse ano vai ser puxado. Pode se preparar pra terminar o ano com menos amigos do que você tinha ano passado.

Dom Pedro I. Fonte: Plenarinho, da Câmara dos Deputados do DF.

Cristiano de Oliveira é colunista do Jornal de Toronto

Esse ano vai ser puxado. Pode se preparar pra terminar o ano com menos amigos do que você tinha ano passado, pois do jeito que a coisa anda, isso é inevitável. E não adianta me dizer “ah, mas eu sou pessoa boa, eu só quero o bem” e revirar os olhinhos, mas depois chegar no Facebook e falar que esquerdista é burro, coxinha tem ovo de solitária no cérebro… Bezerra da Silva hoje em dia cantaria, “Você com o telefone na mão é um bicho feroz / Sem ele anda rebolando e até muda de voz”.

E eu também já vi que vou escutar muito, pois insisto que nesse momento o povo brasileiro é simplesmente a lêndea do piolho da juba do leão desse circo. Dali, a grande maioria não enxerga o que o trapezista realmente está armando lá em cima e vem descontar em mim.

Eu fui gostar de História só depois que me formei e não fui mais obrigado a estudar História, mas aí também me empolguei com a matéria. O problema é que, quanto mais você estuda a História do Brasil, mais você vê que nada mudou.

Retrato de Dom Pedro I, pintado por Benedito Calixto em 1902.

Se dependesse do brasileiro, seríamos colônia de Portugal até hoje – quem fez a independência foi o próprio português, e não o brasileiro. Para o brasileiro, o medo de ver a população pobre (em maioria escrava) se revoltar era maior do que a vontade de ser independente. Então o plano era: “seremos colônia, mas ao menos a negrada está no seu devido lugar e nóis tamo aqui no quentím”. Essa era a mentalidade em 1800 e pouco, e acredite: essa é a mentalidade de hoje. Publicações e universidades simplesmente foram proibidas até a primeira década do século vinte, ou seja, temos só cem anos de educação superior no Brasil. Ninguém nunca ouviu falar de um bisavô formado no Brasil. É difícil mudar a mentalidade de uma população em tão pouco tempo, tanto é que hoje você vê todo mundo clamando por educação, mas aquele medão antigo ao mesmo tempo se manifesta quando grande parte já acrescenta que “educação sim, mas pra ensinar matemática, e não ensinar História, humanismo, etc.”. Ou seja, vá lá, estude, mas não balance muito os esquemas e mantenha no quentím quem é do quentím. É educar pra formar gente que possa construir uma sede nova no meu sítio, e não levar o país pra frente. É a mentalidade do Império que nunca foi embora.

Aquele DNA exploratório e anticomunitário que colonizou o Brasil ainda corre no nosso sangue e a gente nem nota. Reclamamos do político X, mas no dia seguinte queremos que alguém dê o famoso jeitinho pra resolver o nosso lado. Soma-se isso ao medo lá do tempo de D. Pedro, e está alterada a nossa percepção da realidade. Fica fácil cair no conto que o trapezista criou pra guiar a turma do picadeiro.

Questione. Antes de armar barraco, procure se informar direito. Há muito interesse por trás da informação que chega até a gente, e o Brasil só crescerá quando, ao invés de criarmos um fuzuê de ódio e vazio, analisarmos com olho clínico e um pé atrás aquilo que nos é passado.

Adeus, cinco letras que choram.

Sobre Cristiano de Oliveira (30 artigos)
Cristiano é mineiro, atleticano de passar mal, formado em Ciência da Computação no Brasil e pós-graduado em Marketing Management no Canadá. Foi colunista do jornal Brasil News por 12 anos. É um grande cronista do samba e das letras.

1 comentário em D. Pedro e o barraco nosso de cada dia

  1. Cristiano de Oliveira // 14 de maio de 2018 às 9:53 am // Responder

    Amigos leitores, na tentativa de reduzir o meu falatório pra matéria caber no jornal, acabei reduzindo demais e uma informação ficou meio falha: a de que o ensino superior no Brasil só começou no século XX. Na verdade, o ensino superior foi descentralizado e as universidades fundadas no século XX, portanto foi quando realmente ele se tornou acessível. Mas havia sim alguns estabelecimentos de ensino superior no século XIX, de acesso restrito e cursos exclusivos (como a Escola de Medicina da Bahia). Estima-se que 10.000 pessoas tenham se formado em tais entidades à época – um número irrisório, mas que de toda forma contradiz a informação que passei, e por isso peço desculpas.

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