Você tem fome de quê?

Em tempos de pandemia, muitos reclamam do ganho de peso. Não é a fome do corpo que a comida está suprindo

Foto: Fabiana P. Fernandes.

Gui Freitas é colunista do Jornal de Toronto

A obesidade é uma doença multifatorial, que aumentou sua prevalência tanto na população adulta como infantil nas últimas décadas. Muito se discute sobre a importância da mudança de hábitos de vida, consumo de alimentos saudáveis, a prática regular de atividades físicas e um sono regular. Fala-se ainda da predisposição genética, e discute-se sobre padrões estéticos e seu valor na sociedade. Em comemoração ao Dia Mundial da Obesidade – ocorrido em 4 de março, quando é estimulada a discussão sobre o tema –, quero trazer o papel emocional da comida, um fator crucial, pouco falado e pouco compreendido nesse processo.

O alimento traz as calorias necessárias para sobrevivermos e, se a ingesta é maior que a necessidade física, o resultado é a obesidade. Mas essa não é uma matemática simples. Porque a comida também nos traz a memória afetiva, nos lembra a casa da avó e os almoços de domingo, temperados com amor e carinho. É a reunião social, onde fazemos network ou encontramos com os amigos para trocar ideias. É a declaração de amor, um pedido em casamento, uma data especial. É a celebração do aniversário, das bodas, da mudança para a casa nova. É a representação de sua cultura, de suas raízes, de seus ancestrais. E tudo isso se transforma em carinho, em colo, em sensação de pertencimento. A comida não é só o alimento para o corpo, mas para os sentimentos.

Por isso, em tempos de pandemia, muitos reclamam do ganho de peso. Não é a fome do corpo que a comida está suprindo. É a fome das emoções. É a necessidade de se alimentar de bons sentimentos, de boas lembranças. É o açúcar que se transforma em hormônio da felicidade. É o cheiro que inebria o cérebro com tranquilidade. É a textura que aguça os sentidos e acalenta o coração.

O grande segredo é tornar consciente esse processo. Sim, a comida representa tudo isso, mas quando você pensar em comer mais do que seu corpo precisa, se pergunte: neste momento, eu estou com fome de quê? Do alimento do corpo ou dos meus sentimentos? Não é uma missão fácil. E não temos que dar conta sempre. Mas é um grande passo para o controle de peso e de suas emoções.

Leia também a matéria “Comfort language, bom como comfort food”, do jornalista José Francisco Schuster.

Sobre Gia Freitas (17 artigos)
Gia é brasileira, médica pediatra, esposa e mãe de dois filhos. Vivendo em Toronto, na eterna jornada do auto-conhecimento. Apaixonada e idealista, tem na leitura seu refúgio e na escrita sua liberdade.

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