Ineficiência e custo abalam futuro do telefone
José Francisco Schuster é colunista do Jornal de Toronto
O futuro do telefone, criado por Graham Bell em 1874 em Brantford, a 103km de Toronto, parece incerto. As funções de smartphone se sobrepuseram à ideia original do aparelho, sendo hoje a ligação telefônica um uso menor. A decadência que sofre o telefone, entretanto, teve início muito antes. Talvez o primeiro grande golpe tenha sido a invenção do telemarketing e seu abuso, que fez as chamadas, até então esperadas como algo importante, serem vistas como algo inoportuno.
O alto custo da conta telefônica também foi um tiro no pé das empresas de telefonia, com a internet acabando com essa exploração praticada durante décadas. No Brasil, chamadas locais até hoje são cobradas por tempo (os famosos “pulsos”), ligações de fixo para celular são mais caras e outras tantas pegadinhas para cobrar mais. No Canadá, país de imigrantes, as chamadas internacionais fizeram a riqueza das teles. Por volta do ano 2000, as chamadas para Portugal, muito mais baratas do que para o Brasil, custavam $1,50 dólares por minuto.
Aconteceu, também, uma mudança de mentalidade sobre o valor de cada ligação, a medida que a tecnologia foi avançando. Se na década de 70, uma chamada do litoral para a capital, por exemplo, envolvia uma longa fila em um posto telefônico, sendo muito esperada por quem a receberia; hoje ligar de uma ponta a outra do planeta virou corriqueiro. Assim, surgiu a ideia, para alguns, de selecionar quem atender – valendo-se do identificador de chamadas, fundamental nesse processo. O contra-ataque de aparecer no identificador como “número privado” também pode não dar certo, pois há quem nunca atenda esse tipo de ligação. Também colaborou a invenção da secretária eletrônica, que alguns usam como filtro de chamadas. Até entre amigos, se telefonar para convidar para uma festa, certamente a resposta será cortar a conversa com um “me manda os dados por mensagem”, já que é cada vez mais difícil alguém ter à mão um papel e uma caneta. WhatsApp, Facebook, Messenger, Telegram e até os torpedos são a alternativa preferencial de contato, em vez da voz.
Os telefones comerciais, por sua vez, têm uma serventia cada vez menor. Foi praticamente extinta a função de telefonista, substituída pela automação. Contudo, é horrendo para o cliente ter que ouvir todo um menu e não encontrar o que necessita, principalmente falar com um humano – e quando se encontra, o funcionário não atende pela sobrecarga de trabalho. Tente ligar para uma loja de hambúrgueres ou uma grande loja de departamentos para ver quanto custa tal produto, se está em estoque ou coisa parecida. Esqueça: ninguém atenderá.
A moda do atendimento ao cliente só por telefone é outro motivo que levou ao ódio ao aparelho. Após ser impedido de fazer seu pedido na loja ou órgão público, ao telefonar vem a hipócrita mensagem “sua ligação é muito importante para nós” e em seguida uma musiquinha horrenda por uma eternidade, que faz desistir. Assim, se ainda existe um telefone comercial com o qual se consiga falar com facilidade hoje, vai para o Guinness.
Enfim, ainda se quer resolver muita coisa por telefone, mas há cada vez menos quem o atenda prontamente. Desculpe, Graham Bell, mas tudo indica que o telefone em breve fará companhia à máquina de escrever em algum museu.
Ótima reportagem.