Imigrar é deixar seu país e seus pais
José Francisco Schuster é colunista do Jornal de Toronto
Nunca temos completamente em mente todos os efeitos que a imigração irá provocar em nossas vidas, por mais cuidado com que se faça o projeto. A radicalidade de deixar sua terra para viver em outra distante traz um número imenso de alterações em nosso cotidiano que é impossível antever, e mesmo após o choque inicial, com a chegada ao novo país, surpresas vão se desdobrando pouco a pouco ao longo do tempo.
Um dos impactos mais sentidos pelos brasileiros, que vêm de um país com relações afetivas muito fortes com a família e os amigos, é deixar de contar com toda essa rede que fornecia um apoio emocional muito importante para superar as agruras e pequenos problemas do dia a dia. Além disso, a ideia do longo prazo não fica muito clara na cabeça do imigrante. O que se pensa é que será um equivalente a férias, aonde se vai e se volta 30 dias depois, com tudo igual como se deixou. Na verdade, imigração é o oposto, onde sua vida passa a desenvolver-se em sua maior parte em um novo lugar e a sua antiga casa é que se torna local de férias – e olhe lá, quando as condições permitem.
Assim, da mesma maneira como percebemos as mudanças a cada ano que vamos a nosso local de veraneio, nada fica congelado no Brasil enquanto você está fora: crianças crescem, amigos se casam e trocam de emprego e, principalmente, seus pais e avós envelhecem. Eles, que estavam tão bem no aeroporto no dia do seu embarque, passam a apresentar sinais de fragilidade em sua saúde, trazendo preocupação nos contatos e uma sensação de impotência por estar a oito mil quilômetros e não poder ajudar, como de hábito.
Famílias maiores ainda têm a alternativa de irmãos para fornecerem o suporte necessário, mas também eles têm suas ocupações pessoais e realizam migrações internas no país. Há que considerar que, além de as famílias se tornarem cada vez menores, com menos filhos, ainda existe a questão da individualidade de cada filho. Justamente o que imigrou é o que preparava o café do jeitinho que seus pais ou avós gostavam, e que eles sentem tanta falta. Recentemente, inclusive, foi lançado o livro Avós: Raízes e Nós, uma coletânea onde 50 autores já adultos narram como foi importante e marcante sua relação com os avós.
Já para o imigrante, a relação com pais e avós torna-se basicamente virtual, com esporádicas oportunidades de visita. O processo de imigração para trazê-los é dos mais difíceis, uma vez que o interesse do Canadá é por pessoas com bastaste idade produtiva pela frente e que deem pouca despesa de saúde, o que quase impossibilita a reunião familiar. Para os filhos de imigrantes, o contato com seus antepassados torna-se severamente reduzido, acrescido da barreira da língua, pelo pouco contato com o português.
A imigração, portanto, é um cobertor curto, onde tapa-se de um lado para descobrir de outro. É preciso ponderar com calma vantagens e desvantagens antes de jogar-se neste projeto que vira sua vida de cabeça para baixo. E é preciso já garantir no planejamento que seus avós e pais terão um amparo adequado em sua velhice, não ficando abandonados. Aliás, da mesma maneira como você não gostaria de ser abandonado quando for a sua vez.
Exatamente como me sinto Francisco… o texto me representa!! Eu ha quase 5 anos, sozinha, filha unica… meus pais no Sul do Brasil… tentando esse ano sponsor de minha mae e torcendo para ser uma das convidadas a trazer minha mae e depois poder ser sponsor do meu pai.. e que o Universo conspire.. porque cada dia e um desafio!!! Obrigada pelo texto!
Muito bem dito Schuster. A gente não se dá conta do tamanho do mundo que está deixando para trás. Há uns anos, perdi minha mãe no Brasil , que morreu subitamente sem que eu pudesse dizer adeus. Além disso, o imigrante vive numa terra de ninguém. Você não é daqui, é estrangeiro, mas também não é mais de lá… Eu amo Toronto de todo coração, depois de 23 anos, mas sinto muita falta do Brasil. Como conciliar?
Se bem é verdade que o imigrante tem a oportunidade de experimentar duas vidas em uma só, também é verdade que vive em um espaço emocional de eterno não pertencimento: não é mais de lá, assim como não é daqui.
Schuster, muito interessante teu artigo, eu analiso do lado que fica, pois minha filha está a três anos em Portugal com o marido. Embora não seja filha única, pois temos mais um filho e neta, a saudade é um sentimento muito forte, e mesmo que tenhamos condições de visitá- la, neste momento de pandemia mundial, fica mais difícil, ainda que tenhamos os meios tecnológicos para minorar este sentimento a presença física, o toque ainda é de grande importância para nós.
Parabéns pelo artigo.
Abraço
Cláudio Agra
Porto Alegre