Dois pequenos gigantes
Rosana Entler
Em 2020 completo 20 anos de Canadá e posso afirmar que se não fosse pelas minhas infinitas playlists de música brasileira e pelos amigos e artistas brasileiros locais, que para minha felicidade e sanidade mental insistem em manter nossa cultura viva, eu talvez já estivesse em outro lugar.
Foi pensando na cultura brasileira que conversei com dois brasileiros que me inspiram sempre: Naya Illanes Ramos, 8 anos, e Lucas Correia, 9 anos. Quem circula pelas rodas de samba, noites de forró, toques dos tambores do maracatu e shows de artistas brasileiros com certeza já encontrou com esses dois seres iluminados.

Nayá. Foto: Michael Zender.
Naya chegou em Toronto com 2 anos e 3 meses, e na bagagem trazia a turma da Mônica. Sem um personagem preferido, ela se identifica um pouco mais com a Magali porque ela é comilona, e quando falamos em comilança Nayá solta um suspirão e uma lista: “ah, pão de queijo, brigadeiro, pastel, bolo de fubá, tapioca, feijoada!”.
Fluente nas duas línguas, Nayá vai sempre falar em português com quem ela tem certeza que conhece o idioma, e quando pergunto por quê, ela responde: “porque o português é uma língua muito bonita”. Perguntei então o que lhe vem à cabeça quando se fala de Brasil – “minha família e a cultura”. Nayá já subiu ao palco com Liniker, Luegi Luna e Alceu Valença. Seus livros de cabeceira são parte de uma coleção sobre o folclore brasileiro – “Curupira, Saci Pererê e a Cuca são alguns dos personagens do folclore brasileiro”, ela lembra.
Nayá tem ouvido pra música. Ela me conta que conheceu o maracatu acompanhando a mãe aos ensaios e logo ganhou uma alfaia da Mari Palhares. Com expressão de orgulho, me conta que conheceu o Mestre Pitoco da Nação Estrela Brilhante de Recife. Sem saber muito o significado da palava, Nayá já é uma ativista, tocou com o Maracatu na Pride de Toronto em 2019, e também estava lá com sua alfaia no dia do Climate Change Rally.

Lucas. Foto: Adjane Santiago.
Lucas nasceu em Toronto, mas me diz que se considera brasileiro, porque é o único da família que nasceu no Canadá. Além disso, o português foi sua primeira língua, antes mesmo do inglês. Lucas me diz que ama a cultura brasileira, que o diga quem já o viu dançando samba e forró. Lucas joga capoeira – “um dia meu pai me perguntou se eu gostaria de aprender capoeira e eu achei que seria divertido. Hoje amo a capoeira e sua história”. Lucas vai além, me dá uma aula sobre a história da capoeira e realizo que eu não sabia nada sobre o Maculelê.
Lucas me diz que sempre que a família tem uma chance eles vão ao Brasil. Conhece cidades grandes e o interior. Quando pergunto o que ele mais curte no Brasil, pasmem com a reposta – “a feira livre, porque é muito diferente daqui. É colorida, tem muita gente diferente e tem todo dia em diferentes lugares. Adoro ir à feira livre só pra ficar olhando as cores e as pessoas”.
Pergunto ao Lucas se ele acha importante os pais insistirem em manter a cultura brasileira na criação dos filhos que nascem no Canadá, e aqui fica a dica – “com certeza, os pais tem que manter essa cultura dentro da gente para que a gente saiba de onde viemos e também para que possamos conversar com nossa família lá no Brasil. Se a criança começa a responder só em inglês os pais devem insistir que ela repita em português”.
Encerro a conversa com os dois relembrando os tempos em que eram praticamente bebês. O tempo passa rápido demais. Enquanto me preparo para encarar meu 19º inverno canadense, no calor da minha comunidade, não posso deixar de agradecer Nayá e Lucas por fazerem parte dos guardiões da cultura brasileira.
Boas Festas a todos e a todas com muita música brasileira e no calor dessa cultura tão rica e diversa.
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