Meus cinco piores momentos em voos para o Brasil
Cristiano de Oliveira é colunista do Jornal de Toronto
Existem dois momentos revoltantes na vida do imigrante: quando ele descobre que pra beber na rua precisa estar dentro de um chiqueirinho, e quando ele precisa pegar um avião pra ir ou voltar do Brasil. Com o primeiro, você até se acostuma, mas o segundo há de lascar nossas cucarachas vidas por todo o sempre. Venho acumulando más lembranças ao longo desses anos todos; portanto, chega de guardá-las só pra mim. Vamos compartilhar a miséria com o próximo: apresento-lhes o meu Top 5 da Roubada Aérea.
5. Rio-Toronto com a bateria da Imperatriz Leopoldinense
Essa dispensa explicações. E naquela época não tinha nada de comissário de bordo botar moral não. Eles não mandavam em nada e a cuíca roncava de acordo – literalmente.
4. A menina que chuta
Tem menino que entra em avião e parece que tá aprendendo a fazer vinho. Passa o voo inteiro sapateando no encosto da cadeira da frente, e geralmente se senta bem atrás de mim pra exercer esse ofício. Pois um dia, depois do vigésimo coice nas costas, eu pedi educadamente pra menina parar. Como brasileiro é folgado, eu já esperava que o pai fosse me peitar, mas para minha surpresa, os pais se desculparam e a menina tomou uma dura. Gesto raro e bonito, palmas para os pais. Então, como foi que eu me lasquei? Foi lascação emocional: quando o avião pousou, mãe e filha foram para o corredor e se alinharam frente ao meu assento. A mãe olha pra menina e diz “Fala!”. A menina, com uma cara de arrependimento profundo, pede desculpas por ter chutado minha cadeira, e desde esse dia eu me sinto um passageiro tão ruim, mas tão ruim, que as companhias aéreas deveriam preferir levar o Bin Laden com líquidos na bagagem de mão a me levar.

Ilustração de Fabio Ludesi.
3. Pinga-pinga com 100% dos voos atrasados
Cortesia das sensacionais companhias americanas e suas escalas de meia hora em cada uma das 600 conexões. Meu mais recente roteiro com uma delas conseguiu a proeza de ter todos os voos atrasados, e o primeiro, saindo de Toronto, atrasou tanto que eu nem fui, pois já não dava pra pegar a conexão mesmo. E pra voltar pra casa depois de passar por toda a segurança americana do Pearson? Eu tive que imigrar de novo pro Canadá sem ter viajado. Preenchi formulário de bagagem, peguei a fila, passei no computador, no rapaz da imigração… “O senhor está vindo de onde?” Olhei pra ele com aquela cara de mestre do Kung Fu passando um enigma da vida pra Gafanhoto e respondi com a voz do Velho do Rio, “Daqui mesmo, filho”. Deve ter se perdido em reflexão no mistério da resposta, ou então já tinha visto uns 30 na mesma situação e tava de saco cheio, pois me deixou passar sem muitas delongas.

Ilustração de Fabio Ludesi.
2. Geralda do Casamento
O nome é fictício, pra preservar a identidade dessa cidadã muito simpática que me pediu em casamento 7 vezes pra poder se legalizar. Nunca quebrei o galho dela nem de mais ninguém nesse aspecto, mas sabia que ela sempre tentaria de novo, pois viu qualidade no produto e topava até casar de verdade. E cada proposta vinha sempre mais ousada que a anterior. Pois um dia, sento-me na poltrona do avião e ela se senta bem atrás de mim. Tadinha, nem tocou no assunto, mas ainda assim passei as 10 horas de viagem achando que em certa altura ela ia acabar beliscando a minha bunda por entre as poltronas.
1. A explosão
A pior errada ocorreu justamente quando eu não estava nem aí pras erradas: no meu primeiríssimo voo pra cá, em 1998. Encantado com o tamanho do avião da Vasp e com o travesseiro, o tampão de ouvido, a luzinha de leitura etc., eu achei altamente divertido quando a turbina do avião explodiu no momento em que ele começava a correr pra decolar. Um barulhão, aquela freada violenta, mala caindo, o povo gritando enlouquecido, e eu achando tudo muito pitoresco. Todos corriam para as portas, e eu corria pra catar os sensacionais e nunca dantes vistos foninhos de ouvido que todo mundo estava deixando pra trás. O voo foi cancelado, o roteiro teve que mudar todo, a viagem ficou 300 vezes mais complicada, e eu querendo saber se podia levar pra casa essa invenção revolucionária que era o cobertor ultraportátil.
Adeus, cinco letras que choram
Deixe uma resposta