Que Judiciário é issdaí?
José Francisco Schuster é colunista do Jornal de Toronto
Chega o dia na vida em que você descobre que o Judiciário não existe para fazer justiça, mas, como aparelho de Estado que é, seu objetivo é proteger os privilégios das elites. Para fazer com que os que a ela não pertencem sintam o maior incômodo possível ao buscá-la, o judiciário se acomoda em palácios, em vez de escritórios comuns, os juízes usam togas para parecerem superiores, e o linguajar é o mais complicado possível – para que os mortais não entendam nada do que significa “estamos virando o jogo para que, em vez do graúdo que você processou, você se ferre”.
Além disso, advogados deveriam ser um direito universal como saúde pública, afinal, já basta que você está sendo injustiçado. Advogados pagos pelo Estado, contudo, são algo precário no Brasil, como o SUS, e tem que lutar contra bancas mantidas a peso de ouro pelas elites. Uma luta de Davi e Golias. Se o acesso à Justiça é o mais limitado possível à grande maioria, pior é sua transparência à sociedade. Os juízes são os únicos que conheço que se consideram acima do dever de prestar contas de seus atos, com a desculpa esfarrapada de que “os juízes só falam nos autos”. Como podem esquivar-se de entrevistas da imprensa, como se já não bastasse pertencerem ao único sistema no mundo do qual não é cobrada produtividade (empresas privadas vão à falência e Executivo e Legislativo podem cair nas eleições seguintes)?
Nunca tive boa impressão do Judiciário. Afinal, quando meu carro sofreu perda total, a multinacional de agrotóxicos levou o caso até o STJ, arrastando-se por anos. O que recebi não dava para comprar um jogo de pneus. No divórcio do meu pai, seu advogado alertou-o que só andavam os processos dos que molhavam as mãos dos escrivães. E como jornalista, testemunhei a mão impiedosa da Justiça sobre os Sem-Terra e os Sem-Teto em relação a terras abandonadas.
Até há pouco, porém, havia certa teatralidade para que se acreditasse que existia um pouco de Justiça. Agora, assistimos a máscara cair de vez. A parcialidade do Judiciário brasileiro atingiu graus chocantes, com explícita perseguição a seus desafetos e acobertamento dos colegas de elite – afinal, praticamente só consegue passar em concurso para juiz os dela oriundos. Nem mesmo a maior corte do país, o STF, envergonha-se de suas escancaradas preferências, além de a prioridade ser o próprio bolso. E o máximo de punição para um juiz que descumpre do dever é a aposentadoria.
Para completar, temos juízes se enveredando pela política, assumindo compromissos até mesmo antes de deixar seus cargos. A cereja do bolo é o novo governador do Estado do Rio de Janeiro, Wilson Witzel, que deixou a carreira de juiz federal pela política. Ora, se acredita – ou se acreditava – que juízes fossem pessoas ponderadas, equilibradas nas suas decisões, confiáveis como um Ghandi, Dalai Lama ou Papa Francisco. Witzel, porém, agora sabemos, defende a lei da Idade da Pedra, querendo policiais que atirem para matar, atiradores de elite à espreita e presídios em alto-mar. Quantos outros juízes pensarão igual? Como já dizia Chico, “chame o ladrão”.
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