Quando pensamos em imigrantes, por que não incluir Einstein e Cristiano Ronaldo?
Jasper Dag Tjaden é pesquisador do Centro de Análise de Dados da Organização Internacional para as Migrações
[ONU Brasil / The Guardian]
Quando a maioria das pessoas ouve a palavra “imigração” ou “imigrantes”, elas provavelmente pensam em pessoas amontoadas em pequenas embarcações, fugindo para a Grécia ou para a Itália. Eu duvido que a palavra “imigrante” evoque as imagens de Cristiano Ronaldo, Kate Winslet ou Albert Einstein. Isso não é o que as pessoas querem dizer quando falam sobre imigrantes. Mas deveria ser.
O jogador de futebol mais bem-sucedido do mundo, uma atriz do segundo filme de maior sucesso de todos os tempos e uma das pessoas mais inteligentes na História são todos tecnicamente imigrantes. Eu não estou escolhendo a dedo. Minha própria pesquisa mostra que 55% dos futebolistas internacionais, quase metade dos nomeados ao Oscar de Melhor Ator e Melhor Atriz desde 2000 e cerca de um terço dos nomeados para o prêmio Nobel desde 1901 eram imigrantes.
A agência de migração da ONU define um imigrante como “qualquer pessoa que está se deslocando ou se deslocou por uma fronteira internacional ou dentro de um Estado, para longe de seu lugar habitual de residência, independentemente de seu status legal, causa ou razão para o deslocamento ou duração da estadia no país de destino”. O Departamento de Assuntos Econômicos e Sociais das Nações Unidas contabiliza como “imigrantes internacionais” as pessoas que estão vivendo em um país fora de onde elas nasceram ou do país cujo passaporte possuem. A ONU recomenda que qualquer um que permaneça em outro país por mais de três meses seja considerado um imigrante internacional.
Ronaldo, Winslet e Einstein definitivamente preencheriam os requisitos. Ronaldo é um cidadão português que teve empregos na Inglaterra e na Espanha durante a maior parte de sua carreira. Winslet, que é britânica, trabalha nos Estados Unidos e morou lá por longos períodos em sua carreira. O alemão e vencedor do prêmio Nobel Einstein trabalhou na Universidade de Princeton por mais de 20 anos e adquiriu a cidadania estadunidense em 1940.

Albert Einstein, em sua chegada aos Estados Unidos, em 1932. Foto: AP Photo.
A ONU estima que existam aproximadamente 258 milhões de imigrantes internacionais no mundo – isso equivale a 3,4% da população mundial. Mas em média isso é muito mais comum no futebol, na atuação e na academia do que em todo o mundo. As pessoas frequentemente não associam imigração com os ricos e famosos, mas os dados contam uma uma história diferente.
Minha análise, baseada em estatísticas de 2017 da FIFA, revela que 55% de todos os jogadores ativos que competiram por uma seleção em 2017 jogavam em um time fora do país onde eles têm cidadania. Mais de 90% dos jogadores das seleções da Colômbia, Bélgica, Irlanda, Suécia e Suíça jogavam em um time no exterior; 87% da seleção argentina e 83% da seleção brasileira ganhavam dinheiro fora do seu país de cidadania. A média é menor para as seleções europeias maiores: 48% dos jogadores da seleção espanhola, 39% nas seleções francesa e alemã e 13% dos italianos eram, de fato, imigrantes. Dos 100 melhores jogadores em 2017, 72 eram imigrantes. Essas estatísticas não incluem nem mesmo os jogadores que nasceram em um país diferente do qual cresceram e que, mais tarde, adquiriram cidadania.
A busca em dados de todos os nomeados para o Oscar de Melhor Ator e Melhor Atriz desde o ano 2000 mostra que, em média, 41% daquelas pessoas lindas e talentosas são ou eram imigrantes. Ou elas nasceram no exterior e se mudaram para Hollywood ou, no mínimo, elas trabalharam nos Estados Unidos por um longo período de tempo. Os dois casos fazem delas imigrantes. Há mais mulheres imigrantes em Hollywood do que homens: 45% das mulheres nomeadas nasceram fora dos Estados Unidos ou possuem um passaporte que não é estadunidense, em comparação a 33% dos homens nomeados. A maioria deles pode até ser britânica, australiana ou canadense, mas só porque a maioria dos atores “estrangeiros” fala inglês como sua língua materna, isso não os torna menos imigrantes.
Com base numa análise de todos os laureados do Nobel desde 1901, 29% de todos os nomeados para um prêmio Nobel em suas respectivas disciplinas eram imigrantes. “Imigrante”, nesse caso, significa que eles foram nomeados por seu trabalho em uma instituição localizada fora do seu país de nascimento (independentemente de mudanças nas fronteiras). A porcentagem varia ao longo do tempo, entre 0% em 1922, 1965 e 1976, por exemplo, e 75% em 1957 e 1971. Não parece haver uma tendência crescente ou descendente clara com o tempo, o que sugere que as pessoas mais espertas foram pesquisadores internacionais desde que os suecos e noruegueses começaram a conceder os prêmios.
No entanto, apesar de imigrantes estarem sobre-representados entre as pessoas mais bem-sucedidas e privilegiadas do mundo, a hostilidade contra a imigração perdura. A Ipsos Mori descobriu que, em muitos países ocidentais, as pessoas superestimam o número de imigrantes que vivem em seu país por uma ampla margem. Isso sugere que talvez tenhamos uma ideia distorcida de quem é, na verdade, um imigrante e do que eles trazem de contribuição. As percepções importam. Elas podem afetar atitudes gerais em relação a políticas de imigração e alterar eleições.
Talvez muito do que esteja errado com o modo como pensamos sobre imigração se reflita na questão do por que nós não pensaríamos em pessoas bem-sucedidas, ricas, inteligentes e bonitas como imigrantes. Os 258 milhões de imigrantes internacionais que a ONU estima que estejam espalhados pelo mundo são um grupo diverso: jogadores de futebol, atores, premiados do Nobel, mas, não menos importante, enfermeiras, agricultores, mecânicos, cozinheiros, empreendedores e cônjuges – e todos eles merecem ser valorizados.
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