Tão longe, tão perto

Nossa geração eliminou o conceito de distância virtual, mas na realidade física a mudança é bem mais lenta

Arquipélago de Fernando de Noronha. Foto: Cassio Diniz.

José Francisco Schuster é colunista do Jornal de Toronto

O conceito de distância é bastante relativo, cheguei à conclusão. O que pode parecer muito longe, inatingível, pode estar perto, se visto por outro aspecto. Misturam-se, assim, impossível e possível, dependendo apenas da oportunidade, muitas vezes baseada apenas em recursos financeiros para se tê-la.

Nossa geração, ao menos, eliminou o conceito de distância virtual, tornando-o inexistente. Se há poucas décadas mandar uma carta para os confins da Austrália demandaria uma eternidade para que o destinatário a recebesse, hoje, com um e-mail, em um instante ele está lá. Com a internet, passou a ser corriqueiro poder ler jornais do outro lado do mundo, sem diferença de tempo em que os moradores locais o leem. Ouvir rádio do exterior deixou de depender de conseguir sintonia nas ondas curtas e seus chiados, e ainda limitado às grandes estações. Hoje, qualquer uma pode ser ouvida com som perfeito pela web. Não mais falamos com parentes e amigos por curtas e caras chamadas telefônicas, mas por vídeos que não custam nada. Virtualmente, estamos muito próximos.

Na realidade física, a mudança é bem mais lenta. As aulas de história e geografia na escola falam de outros locais, que para o aluno mais parecem situados em outro planeta. Para os estudantes do sul do Brasil, a Guerra de Canudos aconteceu em um lugar muito, muito distante, que mal podem imaginar. O mesmo para os alunos nordestinos, quando se fala de Revolução Farroupilha. Pior quando se passa para História Geral e se começa a falar de Egito, Grécia, Portugal, Itália. Parecem mais com história de ficção do que reais.

Vem a fase adulta, mas as coisas não mudam tanto assim. Para quem não é da cidade, a maioria dos brasileiros, pelas poucas condições econômicas, passará a vida sem ir ao Rio. E, mesmo sendo classe média, quantas vezes você foi? Há quanto tempo não vai? Foi ao Carnaval? E Foz do Iguaçu, e as paradisíacas praias do Nordeste? Vou complicar: você já visitou quantas vezes a capital do seu país, Brasília, e as joias da natureza nacional, a Amazônia e o Pantanal?

E como vai o contato com os vizinhos latino-americanos? Quantas vezes foi a Buenos Aires ou Machu Picchu? Teve oportunidade de conhecer a Europa, que tanto estudamos? Para muitos, talvez somente uma vez, e naquelas excursões onde se conhece trocentos países em uma semana, causando um nó mental que embaralha tudo. Já a África, origem de expressiva parcela de brasileiros, a Ásia, também fonte de imigração, e a Oceania, parecem fora do mapa: pouquíssimos terão oportunidade de visitar. Tudo parece tão longe…

Na sala de embarque dos aeroportos internacionais, porém, tudo fica tão perto, com uma portinha ao lado da outra. Desfilam nos painéis cidades do mundo inteiro. Até cidades que você nem imaginava que encontraria voo direto pra lá: Amsterdam, Johanesburgo, Istambul, Doha… Bastaria você entrar na porta errada (se fosse possível) e estaria em uma cidade que figura apenas em seus sonhos. Cada cidade que parece impossível de você ir tem uma fila de passageiros para embarcar, e, acredite, poucas horas depois estarão lá.

Mesmo em relação às suas próprias férias, você as imagina por anos, economizando para a passagem, falando com as pessoas pela internet, parece algo tão distante; até que um dia você embarca em um avião e, não sem um pouco de espanto, poucas horas depois você chega ao Brasil, onde parecia tão difícil de chegar. Você pensa: “era tão perto, por que não vim antes?”. Na maioria das vezes é o custo – dá raiva não ser menor –, mas em algumas é simples acomodação.

Quem dera fosse viável viajar mais, ir mais vezes aos lugares de que gostamos, estar mais próximos da família e dos amigos, conhecer e aprender com lugares legais que existem mundo afora, dos quais só temos informações pelos livros, TV e internet. Ter um passaporte supercarimbado, como alguns privilegiados. Ou, ao menos, conhecer o básico. Deveria ser um direito, pela expansão de horizontes que proporciona.

Fernando de Noronha, me aguarde! Um dia eu te visito, sua linda!

Sobre José Francisco Schuster (76 artigos)
Com quase 40 anos de experiência como jornalista, Schuster atuou em grandes jornais, revistas, emissoras de rádio e TV no Brasil. Ao longo dos últimos 10 anos, tem produzido programas de rádio para a comunidade brasileira no Canadá, como o "Fala, Brasil" e o "Noites da CHIN - Brasil". Schuster agora comanda o programa "Fala Toronto", nos estúdios do Jornal de Toronto.

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