Um ano de retorno às letras

Pois há um ano, vieram abrir o meu sarcófago.

Capa da primeira edição do Jornal de Toronto.

Cristiano de Oliveira é colunista do Jornal de Toronto

Saudações, Pachecos da Camisa 12.

Há uns dois anos, eu me aposentei do jornalismo brasileiro de Toronto. Foram doze anos escrevendo de graça quinzenalmente – não me pergunte por quê, pois hoje eu também não sei explicar que zoonose foi aquela que me deu. Sei lá, acho que no começo foi o desafio, depois uma forma legal de me conectar com a comunidade, e depois virou insistência mesmo, aquela coisa de não largar o osso, não desistir, pensar nos leitores, etc. Mas, ao mesmo tempo, vou ser muito sincero: eu não vivo pra badalação, não vivo pelo dinheiro… mas gosto bem de uma festa onde não preciso levar Baconzitos e uma caixa de 6. E fui notando que ao mesmo tempo em que eu fazia grandes amizades entre os leitores e ouvia muita coisa bacana deles, escrever pra jornal dava um trampo medonho, tomava tempo, e na hora dos eventos, dos festões, das premiações, eu continuava o mesmo anônimo de sempre. A mesma turma sempre convidada pro baile, indo receber prêmio de imprensa étnica, de imprensa ébria, e tome evento, champanhe, salgadinho, recepção… E o elemento em casa, bebendo água de uma Britta que não trocava o filtro há um ano e comendo cremecraque com atum. Na grande festa do jornalismo, eu cumprimentava os convivas, mas o garçom só chegava até mim pra recolher guardanapo e palito usado. Olhei para um lado e vi meus leitores. Olhei pro outro e vi minha casa pedindo vassoura. Larguei.

Pois há um ano, vieram abrir o meu sarcófago. Vou ser sincero: só de falar em voltar a escrever, já me deu uma preguiça danada. Estava trabalhando igual um louco, nosso grupo Roda de Samba de Toronto lotando casa em todo show, as panelas lá de casa todas socadas no armário debaixo da pia, quase precisando de uma mineradora pra conseguir encontrar minha forma de pudim… A última coisa de que eu precisava era mais serviço.

Porém, uma coisa é estar todo mundo na cachaçada e um cara dizer “ei, e se nós fizéssemos…”. Daí não sai nada. Todo mundo já viu esse filme – eu não só vi como passei mal nesse cinema, comi pipoca, Coors Light, esqueci o nome da atriz no dia seguinte… Outra coisa totalmente diferente é alguém tomar coragem de colocar o bloco na rua e chegar com uma proposta. E a proposta do Jornal de Toronto era inovadora demais pra se ignorar. Contratar um time de colunistas pra produzir material original, sem depender de notícia de internet, e recrutar um conselho editorial é algo que eu ainda não tinha visto por aqui. Cheguei a pensar que era qualidade demais pra um público muito restrito – ao mesmo tempo, lembrei-me de ter ouvido, quando começamos com nosso grupo de samba, que éramos loucos pois Toronto era cidade de pagode. Se funcionou pra nós, talvez fosse o sinal de um novo tempo na comunidade, e poderia funcionar para o Jornal.

Só sei que há um ano eu abraçava a ideia e começava a escrever outra vez, e é com prazer que ainda estou por aqui, assistindo e aplaudindo essa luta. Parabéns ao Jornal de Toronto e que venham muitos outros aniversários.

Adeus, cinco letras que choram.

Sobre Cristiano de Oliveira (30 artigos)
Cristiano é mineiro, atleticano de passar mal, formado em Ciência da Computação no Brasil e pós-graduado em Marketing Management no Canadá. Foi colunista do jornal Brasil News por 12 anos. É um grande cronista do samba e das letras.

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